terça-feira, 16 de junho de 2009

DON VICENTE SÁNCHEZ por Vera Vieira

Foto Ana Márcia Vieira

Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.

Al andar se hace camino
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.

Caminante no hay camino
sino estelas en la mar...

(Antonio Machado)



Veio até mim como muitas pessoas chegam na vida da gente: atravessando mil pontes, desviando labirintos, cruzando oceanos, encarregando intermediários. Na verdade, veio como um presente que jamais havia pedido. Porque o presente era para o meu marido. Mas a presenteada maior e desde sempre, deveria ser eu. Quem saberá os desígnios de Deus para que pessoas cruzem as nossas vidas e nós cruzemos as delas? No dia em que tive nas mãos o livro Momentos de Inspiração, já pressentia o que me esperava. Além das poesias de versos inspiradíssimos do poeta, um encontro ainda maior: um encontro de corações. Foi assim com os versos de Don Vicente Sánchez: um arrebatamento total, um encantamento incondicional. E também, um lamento profundo pela pouca divulgação dos versos daquele poeta nascido espanhol mas brasileiro de coração, que amava Santos, a cidade que o acolheu e a seus ascendentes e descendentes. Consciente de que boas palavras, gestos carinhosos e amabilidades sempre fazem feliz tanto a quem os dá como a quem os recebe, estava evidente que eu não deixaria passar a oportunidade de me encontrar pessoalmente com o poeta Vicente. Uns e-mails trocados entre meu marido, um neto do poeta, jovem amigo, ─ Ricardo, serei sempre grata a você por ter presenteado o Vieira, viu? ¡Gracias toda la vida!, ─ e eu, proporcionaram-me um dos momentos mais intensos que vivi: uma visita ao nobre poeta, já em idade bem avançada. Não me estenderei muito sobre detalhes. Somente algumas palavras... Don Vicente falante e só sorrisos. Don Vicente declamando poesias em espanhol para mim, de memória. Don Vicente o tempo todo de mãos dadas comigo, no sofá. Don Vicente feliz. Eu feliz. Embora estivessem na mesma sala muitos parentes, construímos um mundinho só nosso naquele breve espaço/tempo. Que foi muito rápido mas foi tão intenso que até hoje tenho a sensação de que não saí daquela magia. Bem, como tudo na vida tem um final, deixei aquele apartamento com uma explosão de sentimentos dentro do meu peito, da minha cabeça e da minha memória. Sim, porque embora eu não quisesse aceitar que talvez aquele encontro fosse o único, eu tentava desesperadamente guardar todos os detalhes. Mas eu estava com os pensamentos embotados: chorei muito no caminho de volta ao hotel. Assim como, também num hotel de São Paulo, meses mais tarde, chorei ainda mais, num salão de café da manhã, quando meu marido me ligou para noticiar a morte de Don Vicente. Minha amiga Thereza, com quem eu fazia o passeio cultural do semestre, se dispôs a ir comigo até Santos, mas eu preferi guardar na memória o Don Vicente da única vez. Era o que me bastava: saber que nos fizemos felizes no momento certo. E, além de tudo, eu tinha os seus versos. De qualquer forma, ele continuaria vivo. Hoje penso em tudo isso como uma das mais lindas lições que a vida me ensinou. E a certeza de que não se deve postergar chances para fazermos os outros felizes e nos fazermos felizes também. Porque nada acontece fora de hora. Há um momento certo para tudo. Mas é preciso estar atento, ter olhos “de ver”, para que quando nos dermos conta, não tenhamos que olhar para trás e apenas lamentar a oportunidade para sempre perdida. Nós não perdemos a nossa, não é, Don Vicente? E eu não quero perder a chance que tenho de poder divulgar os versos do poeta: inauguro hoje, um cantinho só para os versos dele. É a minha maneira de reencontrar-me com o poeta e agradecer o que ele vem significando, na minha vida, desde então.

Em sua homenagem, Don Vicente, outros dois poetas espanhóis que amo, falam por mim: Antonio Machado e Joan Manuel Serrat.



Um comentário:

  1. Diante da beleza das palavras escritas - suas - não há o que se dizer, apenas contemplar, de modo que sua irrradiação, como já era de se esperar, só me fez calar, de emoção. Obrigado pelo carinho, inesquecível. Ricardo.

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